Análise real/Integral de Riemann

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Com origem histórica na antiguidade, o cálculo integral foi particularmente enriquecido a partir do momento em que Isaac Newton (1642-1727) e Gottfried Willelm Leibniz (1646-1716) lhe descobriram propriedades inversas da derivação. Até então foi sempre um assunto intimamente ligado ao cálculo de áreas e de volumes, que a partir de meados do século XVI sofre um desenvolvimento metodológico notável promovido principalmente, por Johann Kepler (1571-1630), Galileu Galilei (1584-1642), Buonaventura Cavalieri (1598-1647) e Evangelista Torricelli (1608-1647). Da sua importância bastará recordar o papel das áreas na descrição das leis físicas dos movimentos dos planetas, propostas por Kepler na sua Investigationes Astronomicae, e a segunda obra do mesmo autor, Nova Stereometria Doliorum Vinariorum, exclusivamente dedicada ao cálculo de volumes de sólidos.

Inspirando-se essencialmente no princípio da exaustão, largamente utilizado pelos matemáticos da Grécia antiga, desde Eudoxo (408-355 a.C.) até Arquimedes (287-213 a.C.), a base desse desenvolvimento encontra-se na introdução dos chamados indivisíveis ou infinitésimos, particularmente especificados de forma mais rigorosa por matemáticos do século XIX, entre os quais, Georg Bernhard Riemann (1826-1866). (Para uma descrição histórica detalhada sobre este tema veja-se[1][2][3])-

A integral de Riemann pode ter várias formulações. A versão que iremos apresentar é a devida a Jean-Gaston Darboux (1842-1917), publicada em 1875 nos Annales de l'École Normale Supérieur de Paris. Esta escolha apresenta algumas vantagens, pois sendo então a integral de Riemann uma consequência das integrais superior e inferior, as propriedades destes refletem-se necessariamente nas daquele. Esta ideia é explorada sempre que possível, com proveito em muitos casos.


A integral de Riemann têm como objetivo calcular a região limitada por funções limitadas em intervalos limitados. E calcularemos esta região através da divisão da mesma em retângulos.

  • Já sabemos que a área de um retângulo de lados "a" e "b" é dado por A(Área) = ab. Agora basta saber como faremos a divisão de uma figura por retângulos.

Propriedades de uma área no [editar | editar código-fonte]

  • Se a área for limitada por [a,b]x[0,f(x)]. Então temos x=a; x=b; y=0; y=f(x) limitando nossa figura.
  • Por ser 0<y<f(x), temos que .

Partição do domínio [a,b][editar | editar código-fonte]

  • Quando particionamos a figura em retângulos, conseguimos calcular a área dela com um pequeno erro. É claro que enquanto maior for a partição, menor será o erro.
  • (f,P) significa que a área relacionada a função f estará sendo particionada na partição P.
  • Se tomarmos inicialmente o intervalo [a,b] e particionarmos uma vez, teremos . Aqui estamos dividindo o intervalo [a,b] em
  • Generalizando, podemos particionar o intervalo [a,b] quantas vezes quisermos.
  • Estaremos trocando A(Área) por S(soma de áreas)

Soma inferior e soma superior[editar | editar código-fonte]

  • (A1) Sejam m e M; menor e maior "altura" do retângulo de base b-a
Sejam
. Tomando
  • (A2) Sejam ; menor e maior "altura" do retângulo de base
Podemos calcular a área da partição da seguinte forma:
Por falta conhecido como soma inferior
Onde
Por sobra conhecido como soma superior
Onde
Como . Logo
  • (A3) Seja

  • (A4) o fato que é análogo a (A3)
  • (A2),(A3)e(A4) .

Pelo que vimos acima, quando acrescentamos um único ponto a partição inicial [a,b], a nossa soma inferior ficou maior, e nossa soma superior ficou menor. A nossa idéia então é fazer com que elas se aproximem o suficiente até será para nós quando . Então encontraremos a área da figura.

Relações entre partição e subpartição[editar | editar código-fonte]

Lema 1 (refinando uma partição)[editar | editar código-fonte]

Sejam limitada e as partições

.
Demonstração[editar | editar código-fonte]

Sejam

    • Onde
  • É verdade que . Então
  • De forma análoga se demonstra que

Teorema 1[editar | editar código-fonte]

Sejam limitada, quando se refina uma partição a soma inferior não diminui e a soma superior não aumenta

Demonstração[editar | editar código-fonte]

Pelo Lema 1, Q é uma refinação da partição P.

Corolário[editar | editar código-fonte]

Sejam limitada, e as partições P e Q, onde .

Demonstração[editar | editar código-fonte]

Refinando P nos pontos de Q, e refinando Q nos pontos de P teremos . Como .

Integral inferior e integral superior[editar | editar código-fonte]

Seja todas as partições de [a,b]

  • é a integral inferior de f
  • é a integral superior de f

Pelo Lema 1 .

Logo .

Lema 2 (soma conservada no refinamento)[editar | editar código-fonte]

Seja e são todas as partição de [a,b] que contém c. Assim , então são únicos.

Demonstração[editar | editar código-fonte]

  • Em particular , ou seja, tomemos uma partição que contém {c}
Seja ; onde .
Pelo Lema 1 .
  • olhemos para o fato que A' = {cota inferior de Q} e B' = {cota superior de Q}; A = {cota inferior de P} e B = {cota superior de P}
sup A = sup A', pois
inf B = inf B', pois
  • .

Lema 3[editar | editar código-fonte]

Sejam A, B subconjuntos não vazios e limitados dos reais. (a) => (b)

  • (a) Se , então
  • (b) inf(A+B) = inf A + inf B ; sup(A+B) = sup A + Sup B

Demonstração[editar | editar código-fonte]

  • Dado .
Assim inf A + inf B é uma cota inferior de A+B,
  • Dado
portanto inf A + inf B é o ínfimo do conjunto A + B
  • o sup se mostra analogamente

Corolário[editar | editar código-fonte]

Sejam limitadas. Então

  • (a)
  • (b)

Demonstração[editar | editar código-fonte]

Se , então

pelo teorema e pelo lema 3 temos
(a)
(b)

Teorema 2[editar | editar código-fonte]

Sejam limitada, então

  • (a)
  • (b)

Demonstração[editar | editar código-fonte]

  • (a)Sejam
      • pelo lema 2 e pelo lema 3 temos
  • (b)Sejam
      • pelo lema 2 e pelo lema 3 temos

Lema 4[editar | editar código-fonte]

Seja e ; Dado temos:

  • (a)Se c> 0, então
    • Assim:
  • (b)Se c< 0, então
    • Assim:

Demonstração[editar | editar código-fonte]

  • (a)
  • (b)

Teorema 3[editar | editar código-fonte]

Sejam

  • (a)
  • (b)
    • c>0
    • c<0
  • (c) , então
    • \underline {\int}_{a}^{b} f(x)dx \le \underline {\int}_{a}^{b} g(x)dx
    • \overline {\int}_{a}^{b} f(x)dx \le \overline {\int}_{a}^{b} g(x)dx

Demonstração[editar | editar código-fonte]

Funções integráveis[editar | editar código-fonte]

Das somas de Darboux destacamos as seguintes propriedades elementares.

  1. Para quaisquer partições tem-se .
  2. Se são duas partições tais que (caso em que se diz uma partição mais fina que ou um refinamento da partição ) então e .

As duas propriedades simples acima permitem-nos obter com facilidade a seguinte primeira condição de integrabilidade (ver [4]), muito comum na literatura.

Teorema[editar | editar código-fonte]

Uma função limitada é integrável à Riemann se e só se

  • Para cada existe tal que .

Para provar este teorema comecemos por observar que pelas propriedades algébricas dos ínfimos e dos supremos se tem

Deste modo, se é integrável então para cada existem tais que . Assim, tomando , pela propriedade 2, teremos igualmente,

Reciprocamente, se para cada existir tal que então também , para quaisquer que contenham

Exemplo 1 (funções monótonas)[editar | editar código-fonte]

Seja uma função monótona no intervalo Então é integrável em

Supondo,por exemplo, que é crescente em (no caso decrescente, basta ter em conta que é crescente), temos que é limitada, pois para cada . Do mesmo modo, relativamente a uma qualquer partição de . a diferença de somas de Darboux . Ora, como temos que . Então para cada , se a partição for tal que obtemos . Logo a condição de Riemann é satisfeita e por conseguinte, é integrável em

Igualmente como aplicação da condição de Riemann podemos obter a integrabilidade das funções contínuas. Para o efeito, vamos usar uma propriedade importante das funções contínuas em intervalos compactos (isto é, fechados e limitados): a de serem uniformemente contínuas. Significa isto, que para qualquer , existe , tal que sempre que se tenha .

Exemplo 2 (funções contínuas)[editar | editar código-fonte]

Seja uma função contínua no intervalo Então é integrável em

Comecemos por notar que, pelo teorema de Weierstrass, é uma função limitada em . Pela mesma razão, as somas de Darboux são somas de Riemann. Mais concretamente, para temos e , com , pelo que para a correspondente partição de , vem .

Então na condição de Riemann tomemos arbitrário, na relação acima que define a continuidade uniforme de em , façamos e consideremos o valor cuja existência nos é garantida. Supondo que a partição de possui diâmetro , temos por conseguinte, para cada que donde resulta Logo pela condição de Riemann é integrável em

A condição do teorema assume um aspeto meramente técnico. Ela não nos dá qualquer indício das qualidades que a função deva verificar para ser integrável à Riemann.Um quadro qualitativo desta propriedade, aparece pela mão de Henri Lebesgue, na sua tese doutoral ("Intégrale, Longueur, Aire" (Integral, Comprimento, Área) apresentada na Faculdade de Ciências de Paris em 1902, com base no conceito de conjunto de medida de nula.

Referências[editar | editar código-fonte]

Seja

Lema 5[editar | editar código-fonte]

Demonstrações[editar | editar código-fonte]

  1. U. BOTTAZZINI, Il Calcolo Sublime: Storia dell’Analisi Matematica da Euler a Weierstrass, Boringhieri 1981.
  2. C. B. BOYER, The History of the Calculus and its Conceptual Development, Dover 1949.
  3. C. H. EDWARDS, The Historical Development of the Calculus, Springer-Verlag 1979.
  4. Predefinição:Smallcaps, Elon Lages. Curso de Análise (vol. 1). Rio de Janeiro: IMPA, CNPq, 1976. p. p,249, Teorema 4. ISBN 9-216-05138-8