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Medicina geral e familiar/Medicina baseada na evidência

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Uma das características da Medicina Geral e Familiar é o uso do método clínico centrado no paciente, a essência deste centra-se na dupla compreensão da pessoa e da doença da pessoa. O Raciocínio Clínico segue uma sequência de processos:

  1. Recolha de informação (clínica, comportamental e contextual)
  2. Formulação de hipóteses
  3. Investigação (Colheita de informação suplementar através da anamnese, exame objetivo e exames complementares)
  4. Elaboração de um plano comum
  5. Tomada de decisões
  6. Acompanhamento

É nas fases da formulação de hipóteses e Investigação que a Medicina Baseada na Evidência tem importância . Esta não é mais que uma tentativa de aplicar à prática clínica de forma uniforme e coerente os dados obtidos na investigação científica.

Interpretação dos dados epidemiológicos - Medição da frequência de fenômenos de doença

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A epidemiologia das doenças é muito importante no raciocínio clínico. O aforismo médico "o que é raro é raro, o que é frequente é frequente" procura ilustrar como a frequência de uma doença é necessariamente considerada na hierarquização das hipóteses diagnósticas.

Duas medidas de ocorrência importa considerar: A Prevalência e a Incidência.

A Prevalência é o indicador que mede o número de casos de uma doença (ou condição) existentes numa população num determinado momento; este índice é sempre um número inteiro positivo.

A Taxa de Prevalência é a proporção de indivíduos doentes (ou com essa condição) num determinado momento, no total da população - determinam-se através de estudos epidemiológicos descritivos transversais e obtém-se através da fórmula: Taxa de Prevalência = N.º de casos de existentes de determinada doença / População em que surge a doença * 10(-n)

A Incidência é o indicador que mede o aparecimento de novos casos de doença ao longo dum período de tempo; este índice é sempre um número inteiro positivo.

A Taxa de Incidência é a proporção de indivíduos do total da população que adoece num determinado intervalo de tempo - determinam-se através de estudos epidemiológicos descritivos longitudinais e descritivos e obtém-se através da fórmula: Taxa de Incidência = N.º de novos casos de determinada doença / População em que surge a doença * 10(-n)

Interpretação dos testes diagnósticos

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Considera-se um teste diagnóstico um ato semiológico ou um exame complementar de diagnóstico aplicado ao indivíduo e cujo resultado nos ajuda no diagnóstico, aumentando ou diminuindo a probabilidade de um diagnóstico. Na prática clínica os testes diagnósticos não costumam ser absolutos e podemos assim ter quatro tipos de resultados:

  • Verdadeiros Positivos - quando o teste dá positivo e o indivíduo tem a doença
  • Falsos Positivos- quando o teste dá positivo, mas o indivíduo não tem a doença
  • Falsos Negativos - quando o teste dá negativo, mas o indivíduo tem a doença
  • Verdadeiro Negativo - quando o teste dá negativo e o indivíduo não tem doença
Com doença Sem doença
Teste Positivo Verdadeiro Positivo Falso Positivo
Teste Negativo Falso Negativo Verdadeiro Negativo

De acordo com estes podemos obter alguns indicadores da fidedignidade dos testes, nomeadamente:

Sensibilidade

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Sensibilidade é a proporção de pessoas doentes que tem o teste positivo, antes chamado de "positividade na doença". Um teste muito sensível é muito bom para excluir hipóteses uma vez que tem poucos falsos negativos, no entanto um resultado positivo é menos útil porque a elevada sensibilidade não exclui que possam haver falsos positivos.

A sensibilidade de um teste diagnóstico varia com o estado de evolução da doença.

ou

Especificidade

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Especificidade é a proporção de indivíduos sem doença que apresentam teste negativo, antes chamado de "negatividade na saúde" (neste caso o termo "saúde" é incorretamente usado devendo ser substituído por "ausência de doença"). Um teste muito especifico é muito bom para confirmar diagnósticos uma vez que tem poucos falsos positivos. Quando a especificidade é de 100% então o teste é diagnóstico, em semiologia é Patognomónico. Um resultado negativo é menos útil porque a elevada especificidade não exclui que possam haver falsos negativos.

ou

Valor Preditivo Positivo

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Valor Preditivo Positivo é a proporção de resultados de testes positivos que são verdadeiros positivos. Expressa a probabilidade condicional de um paciente com o teste positivo ter a doença.

Valor Preditivo Negativo

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Valor Preditivo Negativó é a proporção de resultados negativos que são verdadeiros negativos. Expressa a probabilidade condicional de um paciente com o teste negativo não ter a doença.

Os Valores Preditivos indica o poder de um teste de mudar a probabilidade de que uma pessoa tenha (ou não) a doença em questão, no entanto os valores preditivos variam de acordo com a prevalência da doença no contexto em questão.


Razões de Probabilidade

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Likelihood Ratio Positivo (Razão de Probabilidade/Verosimilhança de uma Prova Positiva) expressa em quantas vezes o diagnóstico de uma doença se torna mais provável se o resultado do teste for positivo - corresponde a taxa de probabilidade de um teste ser positivo na presença de doença sobre a probabilidade do teste ser positivo na ausência de doença.

ou

Likelihood Ratio Negativo (Razão de Probabilidade/Verosimilhança de uma Prova Negativa) expressa em quantas vezes o diagnóstico de uma doença se torna mais provável se o resultado do teste for negativo - corresponde a taxa de probabilidade de um teste ser negativo na presença de doença sobre a probabilidade do teste ser negativo na ausência de doença.

ou

Como são calculados a partir da Sensibilidade ou da Especificidade, as razões de probabilidade não variam com a prevalência da doença em questão, mas variam com o estádio de evolução da mesma.

Efetividade das intervenções

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Risco Absoluto é a probabilidade de ocorrência de um evento adverso. A diferença de Riscos Absolutos (RA) chama-se Diferença de Riscos (DR) ou Risco Atribuível.

Risco Relativo é a razão entre os riscos absolutos dos indivíduos expostos e dos não expostos ao fator estudado. É sempre um valor positivo (pode ir de zero ao infinito); se for igual a 1 significa que ambas as intervenções avaliadas possuem eficácia semelhante. No caso de avaliação de intervenções terapêuticas, quanto maior do que 1 for o RR, maior é a eficácia de intervenção que A que B (RR=4 significaria que a intervenção A é quatro vezes mais eficaz que a intervenção B). No caso de avaliação de intervenções preventivas, quanto menor do que 1 for o RR, mais eficaz na prevenção da doença é a intervenção A do que a B (RR=0,25 significaria que a intervenção A reduz o risco de doença quatro vezes mais que a intervenção B). O valor absoluto isolado do RR é uma estimativa pontual pelo que deverão sempre ser calculados os seus intervalos de confiança de 95%, ou se possível, de 99%.

Redução de Risco Relativo é a redução proporcional dos eventos evitados pela não exposição ao fator em estudo (o fator em estudo pode ser um fator de risco ou uma intervenção terapêutica, alterando a ordem da equação)

Redução de Risco Absoluta é a redução absoluta do risco obtida pela (não) exposição ao fator em estudo (o fator em estudo pode ser um fator de risco ou uma intervenção terapêutica, alterando a ordem da equação)

Número necessário a tratar (NNT) é o número de indivíduos que é necessário tratar para obter uma resposta positiva à terapêutica ou para evitar 1 evento adverso. É igual a: 1/DR.

Número necessário para causar dano (NNH) é o número de indivíduos que é necessário tratar para que um deles sofra um efeito adverso ou complicação da terapêutica

Tipos de estudos

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Estudos Observacionais

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Estudos observacionais são investigações em que a informação é sistematicamente colhida, mas o método experimental não é utilizado, porque não há uma intervenção ativa do investigador. Observações sistemáticas, especialmente ao longo do tempo, podem permitir uma conclusão causal, e por conseguinte deve-se respeitar a eficácia destes estudos. No entanto, neste tipo de estudos não há equivalência estatística entre os dois grupos estudados. Este tipo de estudo são frequentes na área da medicina onde, por razões éticas, não é possível formar verdadeiros grupos de controle (sem nenhuma medicação, por exemplo). Os estudos observacionais podem ser: descritivos e analíticos. Estudos observacionais descritivos caracterizam-se por descrever uma situação. Isto é, a distribuição da doença na população em relação ao sexo, idade ou outras características. Estudos observacionais analíticos tentam explicar uma situação ou os seus processos determinativos (Por que é que a doença ocorre nessas pessoas? Pode a diminuição da incidência de uma doença ser atribuída à introdução de alguma medida preventiva?) É geralmente feito pela formulação de hipóteses e baseiam-se frequentemente em estudos descritivos prévios.

Estudos Experimentais

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Estudo experimental é o tipo de investigação em que o investigador, desejando estudar os efeitos da exposição ou da ausência de um determinado fator, decide, ele mesmo, quais os elementos (pessoas, animais, cidades etc.) serão expostos ou não ao referido fator. Portanto são estudos em que há uma intervenção deliberada do investigador. Quando compara indivíduos expostos com outros não expostos ao referido fator, estará a conduzir um estudo controlado. O ensaio clínico é a tentativa de tradução do estudo experimental (realizado em laboratório com animais) para a prática clínica, utilizando pessoas ou pacientes como objeto de investigação. A seleção dos pacientes deve ser feita de forma que minimize variações que possam afetar as comparações entre os grupos em investigação. Isto é feito, geralmente, utilizando o processo de randomização. O ensaio clínico fornece as evidências mais consistentes para o estabelecimento de relações de causalidade.

Num estudo observacional o investigador apenas observa o que acontece e tenta tirar conclusões baseadas nessas observações. Num estudo experimental, o investigador manipula variáveis numa população e tenta determinar a influência que essas variáveis exercem na população.

Estudos analíticos

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Estudos de coorte

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Partem da causa para o efeito, exigindo para tal a divisão da população em estudo em dois grupos: o de expostos ao suposto fator de risco e o dos não expostos a esse fator. Os grupos são então seguidos, de forma retrospectiva, prospectiva ou ambispectiva para registro do efeito produzido pelo fator de exposição; A direção do estudo é sempre no sentido Exposição -Doença

“Timing” do estudo:

  • Prospectivo (segue da exposição para a doença acompanhando o tempo real, ou seja o inicio do estudo dá-se antes do inicio da doença)
  • Retrospectivo (segue da exposição para a doença no passado ou tempo histórico, ou seja, o inicio do estudo dá se faz depois de estabelecida a doença)

Utilidade: calcular o Risco Relativo (é a proporção entre a incidência da doença nos expostos com a incidência da doença nos não expostos); Risco Atribuível (mede a diferença entre a incidência nos expostos vs a incidência nos não-expostos, é a quantidade de risco que pode ser atribuída ao fator em estudo); Fração Etiológica do Risco (FER) é a proporção de risco atribuível à exposição ou seja a proporção de casos novos da doença relacionadas com a exposição ao fator em estudo -FER=RA/Incidência dos expostos); Fração Etiológica do Risco Populacional (FERP) é percentagem de indivíduos vítimas de uma determinada doença na população total que poderia não ficar doente (ou não morrer) se o agente ou fator de risco fosse completamente eliminado da população total, FERP = [(Incidência na população – Incidência não expostos) / Incidência na população]

Exemplo: exposição ao tabaco vs desenvolvimento de cancro de pulmão

Estudos casos-controle

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Partem do efeito para a causa, exigindo para isso a formação de um grupo de indivíduos com determinada doença (casos) e de um grupo controle constituído por indivíduos semelhantes, mas sem a doença. As características (possíveis causas da doença) dos indivíduos de cada grupo são levantadas e verificadas as frequências delas nos dois grupos. Este desenho é retrospectivo, pois doença e exposição já aconteceram no momento do estudo. A direção do estudo é sempre no sentido Doença – Exposição. Utilidade: estudo de doenças pouco frequentes ou com grandes períodos de latência; calcular o “Odds ratio” ou “Razão de Probabilidades”. Trata-se de uma medida de associação, cujo objetivo é a comparação da frequência de exposição nos casos com a frequência de exposição nos controles. Por exemplo, compara a frequência dos hábitos tabágicos dos “casos” com a frequência dos hábitos tabágicos dos “controles”.


Os estudos epidemiológicos dizem-se analíticos quando têm como propósito o estabelecimento de relação entre causas e efeitos ou a avaliação de procedimentos terapêuticos ou preventivos, testando dessa forma hipóteses.

Eles são sempre antecedidos por estudos descritivos os quais não testam hipóteses, mas são a base para a formulação destas. Os estudos descritivos têm por objetivo determinar a distribuição de doenças ou condições relacionadas à saúde, segundo o tempo, o lugar e/ou as características dos indivíduos. Ou seja, responder à pergunta: quando, onde e quem adoece?


Os estudos de coorte e de casos-controle são ditos observacionais porque o pesquisador não exerce controle sobre variáveis, limitando-se à observação e registro de eventos. Pelo contrário, nos chamados estudos clínicos randomizados, destinados à avaliação de cuidados à saúde, terapêuticos ou preventivos, o pesquisador controla variáveis.

Classificação da evidência científica

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A evidência científica pode ser classificada quanto à qualidade da fonte da informação (ou metodologia do estudo) e quanto à força das recomendações para a prática clinica. No que respeita à qualidade da fonte o valor da evidência científica é diretamente proporcional ao poder estatístico do tipo do estudo, assim a evidência científica pode ser hierarquizada em diferentes níveis de evidência.

A seguinte tabela é adaptada da United States Preventive Services Task Force (USPSTF)[1]:

Nível Descrição
I Evidência obtida a partir de pelo menos um ensaio clínico controlado e aleatorizado desenhado de forma apropriada
II1 Evidência obtida a partir de ensaios controlados não aleatorizados e desenhados de forma apropriada
II2 Evidencia obtida a partir de estudos de coorte ou caso-controle desenhados de forma apropriada realizados preferencialmente me mais de um centro ou grupo de investigação
II3 Evidencia obtida a partir de várias séries comparadas no tempo
III Opiniões baseadas em experiência clínica, estudos descritivos ou conclusões de comitês de peritos


Também existem escalas de recomendações, de hierarquizam a força da recomendação na prática clínica. A seguinte também foi elaborada pela USPSTF:

Grau Descritivo
A existe evidencia científica forte para recomendar a adoção da intervenção
B existe evidencia científica moderada para recomendar a adoção da intervenção
C existe evidencia científica insuficiente, pelo que a decisão de adotar a intervenção deve basear-se em outros critérios
D existe evidencia científica suficiente para recomendar a não adoção da intervenção

Referências