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Gramática
[editar | editar código-fonte]Organização
[editar | editar código-fonte]Eu acredito que o ideal quando se quer criar uma língua é começar pela gramática, decidindo qual será a ordem das palavras na oração e como elas vão formar uma frase. Claro que não é uma coisa muito original ir traduzindo palavra por palavra a partir do português. Construtores de linguagens criam a sua própria ordem. Tomemos um exemplo.
Kevin está regando as flores.
Vemos que existem três termos fundamentais na oração: "Kevin", o núcleo do sujeito, "regar", o verbo, e "flor", o núcleo do objeto. A ordem das palavras na língua portuguesa é "Sujeito-Verbo-Objeto". Essa é a ordem falada por mais pessoas, e está presente em línguas como o mandarim, o espanhol e o inglês. Agora, observe como essa frase fica em japonês.
Kevin wa hana no mizu yari desu.
O japonês é uma língua "Sujeito-Objeto-Verbo". A maioria das línguas do mundo estão organizadas nessa ordem, como coreano, turco e hindi, embora menos pessoas falem esses idiomas. "Kevin" vem primeiro, "hana", que significa "flores", está em segundo e no final está "mizu", que significa "regar". Os outros termos na oração somente caracterizam o verbo ou são conjunções.
Existem ainda algumas línguas com ordens diferentes é claro, mas 75% das línguas no mundo são desses dois tipos. Se você estiver fazendo uma linguagem a posteriori, então seria prudente escolher Sujeito-Verbo-Objeto, mas você pode fazer do modo que você quiser se estiver criando um idioma alienígena. É possível fazer com que tanto faça a ordem dos termos na frase, usando a flexão de modo, uma flexão que indica a função que a palavra está exercendo.
Você precisa decidir também a ordem em que os adjuntos e complementos vão aparecer. No alemão e no inglês, o nome fica sempre por último e seus adjuntos ficam atrás, como "blue flower", mas em espanhol e português é ao contrário.
Depois de resolver essa questão, você precisa pensar em como você vai formar orações adjetivas, aquelas que caracterizam um nome. No português, usamos um pronome relativo, normalmente "que", "quem", "o qual", "onde", "quanto" ou "cujo".
A flor que Kevin regou é azul.
Mas, em várias línguas, não existem pronomes relativos. Você simplesmente usa um pronome pessoal.
A flor, Kevin regou-a, é azul.
É importante também formar perguntas. No português, usamos uma mudança na entonação, mas essa técnica é evitada por várias línguas ao redor do mundo. Em vários idiomas como mandarim ou vietnamita, mudanças no tom de voz podem inclusive mudar o sentido da frase ou palavra. Na maioria das vezes, a melhor solução é usar uma flexão ou uma palavra pequena que indique a pergunta. Pense em como você vai fazer as perguntas com pronomes relativos. Em português, nós colocamos o pronome na frente, mas em várias línguas ele é colocado no lugar do objeto. Por exemplo, no mandarim, em vez de "o quê aconteceu aqui?", dizemos "aconteceu aqui o quê?". Também existem meios de indicar se a resposta que você espera é "sim" ou "não". Veja os exemplos abaixo. O primeiro sugere a resposta "não", enquanto que o segundo sugere a resposta "sim".
- A parede não é vermelha, é?
- A parede é vermelha, não é?
No português, temos que fazer uma nova oração, como "não é?", por exemplo, para poder criar essa sensação de que uma resposta está sendo sugerida. Porém, essa expectativa pode ser indicada com flexões ou palavras, se você quiser.
Não se esqueça também de pensar em como negar uma frase. Na maioria das línguas ocidentais, se adiciona uma palavra próxima ao verbo, como o nosso "não". Mas no japonês, por exemplo, o verbo pode ser flexionado para indicar negação. Ou você pode fazer como no inglês, usando um verbo auxiliar, como o "to do".
Morfossintaxe
[editar | editar código-fonte]Olhando novamente para o nosso exemplo, é óbvio que "regar" e "flor" não estão do modo como os encontramos no dicionário. Eles estão flexionados. "Regar" fica "está regando", de acordo com a terceira pessoa e indicando que a ação está sendo feita no exato momento. A palavra "flor" fica "flores", pois é plural. O português é uma língua flexiva pois flexiona as palavras adicionando morfemas para formar novas palavras.
cacofonia (som ruim)
caco (ruim) + fono (sonoro) + ia (indica adjetivo substantivado)
A flexão é algo que acontece em muitas outras línguas no ocidente. No inglês, por exemplo, temos "write", "wrote" e "written", dependendo do tempo em que o verbo está.
Uma outra forma de criar palavras novas é a fusão. Em linguagens fusionais, muitos morfemas são juntados de modo que fica realmente difícil separá-los. Embora as palavras fiquem compridas, costumam ser bem mais precisas. Um bom exemplo é o alemão, embora outras línguas como grego e russo também sejam um pouco fusionais. Por exemplo, existe uma única palavra em alemão para aquela água da chuva que flui sobre o solo quando não consegue penetrar nele.
Oberflächenwasser
Ober (sobre) + flächen (superfície) + wasser (água)
Existem também aquelas línguas que são aglutinantes, como o finlandês, o húngaro ou o turco, onde muitas palavras de uma frase são fundidas, inclusive aquelas com diferentes funções sintáticas, podendo misturar sujeito e predicado e expressar uma oração completa com apenas uma palavra. Embora costumem economizar saliva, são essas línguas que batem os recordes mundiais de palavras mais compridas. A frase "eu me pergunto se deveria me sentar por um tempo" pode ser escrita desse jeito.
istahtaisinkohan
istah (sento-me) + tai (por um tempo) + sinko (deveria?) + han (pergunto-me)
Todas as línguas que flexionam, aglutinam ou fundem são chamadas de línguas sintéticas. Existem ainda aquelas linguagens que não são sintéticas, ou seja, não unem palavras nem utilizam afixos, as chamadas línguas analíticas. A mais famosa é o mandarim, mas também são analíticas todas as outras variedades de chinês, coreano e alguns outros, o que equivale a um quinto da população mundial. Em primeira análise, teriam que ser muitas palavras e algumas seriam muito compridas. Contudo, no mandarim, por exemplo, o vocábulo é praticamente monossilábico. Isso porque uma única palavra pode ter muitos significados diferentes. Além disso, o mandarim é uma linguagem tonal, ou seja, o tom da pronúncia é importante para o significado da palavra. Embora seja rara a existência de idiomas tonais no Ocidente, a maioria das línguas do mundo são tonais. No mandarim temos 4 tipos diferentes de tons, além do tom neutro, e cada um resulta num entendimento completamente diferente do sentido da palavra.
mā, má, mǎ, mà (clique para escutar)ajuda, arquivo
O modo que você vai usar para formar palavras depende bastante do tipo de escrita que você vai usar. Se a escrita é a partir de logogramas, ou seja, símbolos que significam palavras, como acontece no mandarim, o ideal é uma língua analítica com palavras de pronúncia rápida e simples. Porém, se você quer escrever com um alfabeto onde as letras representem sons ou sílabas, não há problema algum em unir várias palavras em uma só.