Medicina geral e familiar/Medicina baseada na evidência: diferenças entre revisões

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Revisão das 21h18min de 7 de novembro de 2010

Introdução

O Raciocínio Clínico segue uma sequência que se inicia na recolha de informação, seguida da sua interpretação e finalmente a tomada de decisões. A informação recolhida pode ter origem na Anamnese, no Exame Objectivo ou nos resultados de Exames Complementares de Diagnóstico, a Interpretação consiste na junção de todos os dados recolhidos e sua análises de acordo com os conhecimentos prévios, as Decisões tomadas podem abranger a procura de mais informação através da colocação de novas perguntas ao doente, do aprofundar do Exame Objectivo ou da realização de novos Exames Complementares de Diagnóstico.

É na fase da interpretação da informação que a Medicina Baseada na Evidência tem importância. Esta não é mais que uma tentativa de aplicar à prática clínica de forma uniforme e coerente os dados obtidos na investigação científica. Estes dados podem ser agrupados em três grandes grupos: os relacionados com a epidemiologia das doenças, os relacionados com a fidedignidade da informação recolhida (ou fidedignidade dos testes diagnósticos) e a efectividade das intervenções médicas.

Relativamente à Medicina Baseada na Evidência importa ainda compreender de que forma foi obtida a informação científica de forma a conhecer melhor a qualidade da evidência científica.

Interpretação dos dados epidemiológicos - Medição da frequência de fenómenos de doença

A epidemiologia das doenças é muito importante no raciocínio clínico. O aforismo médico "o que é raro é raro, o que é frequente é frequente" procura ilustrar como a frequência de uma doença é necessariamente considerada na hierarquização das hipóteses diagnósticas.

Duas medidas de ocorrência importa considerar: A Prevalência e a Incidência.

A Prevalência é o indicador que mede o número de casos de uma doença (ou condição) existentes numa população num determinado momento; este índice é sempre um número inteiro positivo. A Taxa de Prevalência é a proporção de indivíduos doentes (ou com essa condição) num determinado momento, no total da população - determinam-se através de estudos epidemiológicos descritivos transversais e obtem-se através da fórmula: Taxa de Prevalência = N.º de casos de existentes de determinada doença / População em que surge a doença * 10(-n)


A Incidência é o indicador que mede o aparecimento de novos casos de doença ao longo dum período de tempo; este índice é sempre um número inteiro positivo. A Taxa de Incidência é a proporção de indivíduos do total da população que adoece num determinado intervalo de tempo - determinam-se através de estudos epidemiológicos descritivos longitudinais e descritivos e obtem-se através da fórmula: Taxa de Incidência = N.º de novos casos de determinada doença / População em que surge a doença * 10(-n)

Interpretação dos testes diagnósticos

Considera-se um teste diagnóstico um acto semiológico ou um exame complementar de diagnóstico aplicado ao individuo e cujo resultado nos ajuda no diagnóstico, aumentando ou diminuindo a probabilidade de um diagnóstico. Na prática clínica os testes diagnósticos não costumam ser absolutos e podemos assim ter quatro tipos de resultados:

  • Verdadeiros Positivos - quando o teste dá positivo e o indivíduo tem a doença
  • Falsos Positivos- quando o teste dá positivo, mas o indivíduo não tem a doença
  • Falsos Negativos - quando o teste dá negativo, mas o indivíduo tem a doença
  • Verdadeiro Negativo - quando o teste dá negativo e o indivíduo não tem doença

De acordo com estes podemos obter alguns indicadores da fidedignidade dos testes, nomeadamente:

Sensibilidade é a proporção de indivíduos doentes que tem o teste positivo. Um teste muito sensível "apanha" a maioria dos doentes, obtendo-se assim um elevado valor preditivo dos negativos, enquanto que um teste pouco sensível gera muitos falsos negativos.

Especificidade é a proporção de indivíduos sadios que apresentam teste negativo. Um teste muito específico exclui a maioria dos indivíduos sadios, obtendo-se assim um elevado valor preditivo positivo, enquanto que um teste pouco específico pode identificar incorrectamente um indivíduo saudável como doente (falso positivo). A principal aplicação dos testes muito específicos é a exclusão de um diagnóstico.

Likelihood Ratio Positivo (Razão de Probabilidade/Verosimilhança de uma Prova Positiva) expressa em quantas vezes o diagnóstico de uma doença se torna mais provável se o resultado do teste for positivo - corresponde ao ratio da probabilidade de um teste ser positivo na presença de doença sobre a probabilidade do teste ser positivo na ausência de doença.

ou

Likelihood Ratio Negativo (Razão de Probabilidade/Verosimilhança de uma Prova Negativa) expressa em quantas vezes o diagnóstico de uma doença se torna mais provável se o resultado do teste for negativo - corresponde ao ratio da probabilidade de um teste ser negativo na presença de doença sobre a probabilidade do teste ser negativo na ausência de doença.

ou

Valor Preditivo Positivo é a proporção de verdadeiros positivos entre todos os indivíduos com teste positivo. Expressa a probabilidade de um paciente com o teste positivo ter a doença.

Valor Preditivo Negativó é a proporção de verdadeiros negativos entre todos os indivíduos com teste negativo. Expressa a probabilidade de um paciente com o teste negativo não ter a doença.

Efectividade das intervenções

Risco Absoluto é a probabilidade de ocorrência de um evento adverso. Á diferença de Riscos Absolutos (RA) chama-se Diferença de Riscos (DR) ou Risco Atribuível.

Risco Relativo é a razão entre os riscos absolutos dos indivíduos expostos e dos não expostos ao factor estudado. É sempre um valor positivo (pode ir de zero ao infinito); se fôr igual a 1 significa que ambas as intervenções avaliadas possuem eficácia semelhante. No caso de avaliação de intervenções terapêuticas, quanto maior do que 1 fôr o RR, maior é a eficácia de intervenção que A que B (RR=4 significaria que a intervenção A é quatro vezes mais eficaz que a intevenção B). No caso de avaliação de intervenções preventivas, quanto menor do que 1 fôr o RR, mais eficaz na prevenção da doença é a intervenção A do que a B (RR=0,25 significaria que a intervenção A reduz o risco de doença quatro vezes mais que a intevenção B). O valor absoluto isolado do RR é uma estimativa pontual pelo que deverão sempre ser calculados os seus intervalos de confiança de 95%, ou se possível, de 99%.


Redução de Risco Relativo é a redução proporcional dos eventos evitados pela não exposição ao factor em estudo (o factor em estudo pode ser um factor de risco ou uma intervenção terapêutica, alterando a ordem da equação)

Redução de Risco Absoluta é a redução absoluta do risco obtida pela (não) exposição ao factor em estudo (o factor em estudo pode ser um factor de risco ou uma intervenção terapêutica, alterando a ordem da equação)

Número necessário a tratar (NNT) é o número de indivíduos que é necessário tratar para obter uma resposta positiva à terapêutica ou para evitar 1 evento adverso. É igual a: 1/DR.

Número necessário para causar dano (NNH) é o número de indivíduos que é necessário tratar para que um deles sofra um efeito adverso ou complicação da terapêutica

Tipos de estudos

Estudos Observacionais Estudos observacionais são investigações em que a informação é sistematicamente colhida, mas o método experimental não é utilizado, porque não há uma intervenção activa do investigador. Observações sistemáticas, especialmente ao longo do tempo, podem permitir uma conclusão causal, e por conseguinte deve-se respeitar a eficácia destes estudos. No entanto, neste tipo de estudos não há equivalência estatística entre os dois grupos estudados. Este tipo de estudo são frequentes na área da medicina onde, por razões éticas, não é possível formar verdadeiros grupos de controlo (sem nenhuma medicação, por exemplo). Os estudos observacionais podem ser: descritivos e analíticos. Estudos observacionais descritivos caracterizam-se por descrever uma situação. Isto é, a distribuição da doença na população em relação ao sexo, idade ou outras características. Estudos observacionais analíticos tentam explicar uma situação ou os seus processos determinativos (Por que é que a doença ocorre nessas pessoas? Pode a diminuição da incidência de uma doença ser atribuída à introdução de alguma medida preventiva?) É geralmente feito pela formulação de hipóteses e baseiam-se frequentemente em estudos descritivos prévios.

Estudos Experimentais Estudo experimental é o tipo de investigação em que o investigador, desejando estudar os efeitos da exposição ou da ausência de um determinado factor, decide, ele mesmo, quais os elementos (pessoas, animais, cidades etc.) serão expostos ou não ao referido factor. Portanto são estudos em que há uma intervenção deliberada do investigador. Quando compara indivíduos expostos com outros não expostos ao referido factor, estará a conduzir um estudo controlado. O ensaio clínico é a tentativa de tradução do estudo experimental (realizado em laboratório com animais) para a prática clínica, utilizando pessoas ou pacientes como objecto de investigação. A selecção dos pacientes deve ser feita de forma que minimize variações que possam afectar as comparações entre os grupos em investigação. Isto é feito, geralmente, utilizando o processo de randomização. O ensaio clínico fornece as evidências mais consistentes para o estabelecimento de relações de causalidade.

Resumindo: Num estudo observacional o investigador apenas observa o que acontece e tenta tirar conclusões baseadas nessas observações. Num estudo experimental, o investigador manipula variáveis numa população e tenta determinar a influência que essas variáveis exercem na população.

Estudos analíticos

Estudos de coorte

Partem da causa para o efeito, exigindo para tal a divisão da população em estudo em dois grupos: o de expostos ao suposto factor de risco e o dos não expostos a esse factor. Os grupos são então seguidos, de forma retrospectiva, prospectiva ou ambispectiva para registo do efeito produzido pelo factor de exposição; A direcção do estudo é sempre no sentido Exposição -Doença “Timing” do estudo: - Prospectivo (segue da exposição para a doença acompanhando o tempo real, ou seja o inicio do estudo dá-se antes do inicio da doença) - Retrospectivo (segue da exposição para a doença no passado ou tempo histórico, ou seja, o inicio do estudo dá se faz depois de estabelecida a doença) Utilidade: calcular o Risco Relativo (é a proporção entre a incidência da doença nos expostos com a incidência da doença nos não expostos); Risco Atribuível (mede a diferença entre a incidência nos expostos vs a incidência nos não-expostos, é a quantidade de risco que pode ser atribuída ao factor em estudo); Fracção Etiológica do Risco (FER) é a proporção de risco atribuível à exposição ou seja a proporção de casos novos da doença relacionadas com a exposição ao factor em estudo -FER=RA/Incidência dos expostos); Fracção Etiológica do Risco Populacional (FERP) é percentagem de indivíduos vítimas de uma determinada doença na população total que poderia não ficar doente (ou não morrer) se o agente ou factor de risco fosse completamente eliminado da população total, FERP = [(Incidência na população – Incidência não expostos) / Incidência na população] Exemplo: exposição ao tabaco vs desenvolvimento de cancro de pulmão


Estudos casos-controlo

Partem do efeito para a causa, exigindo para isso a formação de um grupo de indivíduos com determinada doença (casos) e de um grupo controlo constituído por indivíduos semelhantes, mas sem a doença. As características (possíveis causas da doença) dos indivíduos de cada grupo são levantadas e verificadas as frequências delas nos dois grupos. Este desenho é retrospectivo, pois doença e exposição já aconteceram no momento do estudo. A direcção do estudo é sempre no sentido Doença – Exposição. Utilidade: estudo de doenças pouco frequentes ou com grandes períodos de latência; calcular o “Odds ratio” ou “Razão de Probabilidades”. Trata-se de uma medida de associação, cujo objectivo é a comparação da frequência de exposição nos casos com a frequência de exposição nos controlos. Por exemplo, compara a frequência dos hábitos tabágicos dos “casos” com a frequência dos hábitos tabágicos dos “controlos”.



Os estudos epidemiológicos dizem-se analíticos quando têm como propósito o estabelecimento de relação entre causas e efeitos ou a avaliação de procedimentos terapêuticos ou preventivos, testando dessa forma hipóteses.

Eles são sempre antecedidos por estudos descritivos os quais não testam hipóteses, mas são a base para a formulação destas. Os estudos descritivos têm por objectivo determinar a distribuição de doenças ou condições relacionadas à saúde, segundo o tempo, o lugar e/ou as características dos indivíduos. Ou seja, responder à pergunta: quando, onde e quem adoece?




Os estudos de coorte e de casos-controlo são ditos observacionais porque o pesquisador não exerce controlo sobre variáveis, limitando-se à observação e registo de eventos. Pelo contrário, nos chamados estudos clínicos randomizados, destinados à avaliação de cuidados à saúde, terapêuticos ou preventivos, o pesquisador controla variáveis.

Classificação da evidência científica

A evidência científica pode ser classificada quanto à qualidade da fonte da informação (ou metodologia do estudo) e quanto à força das recomendações para a prática clinica. No que respeita à qualidade da fonte o valor da evidência científica é directamente proporcional ao poder estatístico do tipo do estudo, assim a evidência cientifica pode ser hierarquizada em diferentes níveis de evidência.

A seguinte tabela é adaptada da United States Preventive Services Task Force (USPSTF)[1]:

Nível Descrição
I Evidência obtida a partir de pelo menos um ensaio clínico controlado e aleatorizado desenhado de forma apropiada
II1 Evidência obtida a partir de ensaios controlados não aleatorizados e desenhados de forma apropriada
II2 Evidencia obtida a partir de estudos de coorte ou caso-controlo desenhados de forma apropriada realizados preferencialmente me mais de um centro ou grupo de investigação
II3 Evidencia obtida a partir de várias séries comparadas no tempo
III Opiniões baseadas em experiência clínica, estudos descritivos ou conclusões de comités de peritos



Também existem escalas de recomendações, de hierarquizam a força da recomendação na prática clínica. A seguinte também foi elaborada pela USPSTF:

Grau Descritivo
A existe evidencia científica forte para recomendar a adopcão da intervenção
B existe evidencia científica moderada para recomendar a adopção da intervenção
C existe evidencia científica insuficiente, pelo que a decisão de adoptar a intervenção deve basear-se em outros critérios
D existe evidencia científica suficiente para recomendar a não adopção da intervenção


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Referências