Cultura do Japão/Teatro do Japão

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Amaterasu surge da luz de Utagawa Kunisada (1786-1865). (xilogravura colorida, sem data).

O teatro tradicional do Japão, que inclui o nô, o kyogen, o kabuki e o bunraku, tem como característica, diferentemente do teatro ocidental, a união entre a representação, a dança e a música — o canto e os instrumentos musicais.[1][2] Sua origem está associada à religião tanto mitologicamente quanto historicamente.

Mitologicamente atribui-se a origem do teatro no Japão a dança da deusa Uzume. Segundo o Konjiki, um dia os deuses Izanagi e Izanami teriam enviado seu filho Suzanoo para a Terra de Yomi (Terra dos Mortos) como castigo por suas más ações. Antes de partir, ele resolveu visitar sua irmã mais velha, a deusa do Sol, Amaterasu. Suzanoo pregou várias peças em Amaterasu e esta, irritada, se refugiou em uma caverna, mergulhando o mundo em escuridão. Preocupados, os deuses se reuniram para pensar em uma maneira de fazê-la sair de lá. Resolveram dar uma festa na frente da caverna. Em dado momento, a deusa Uzume, munida de uma lança e de um capuz, começou a dançar em cima de um barril em meio aos deuses fazendo com que todos rissem. O barulho atraiu Amaterasu trazendo a luz de volta ao mundo. Depois disso, Suzanoo foi castigado.[3] Uzume teria descido a Terra e dado origem a família imperial e às primeiras sacerdotisas.

Historicamente, as danças religiosas que eram executadas em templos, santuários e festivais como a kagura — dança xintoísta —, a gigaku e a bugaku — danças budistas com origem na Índia e China respectivamente —, além de danças populares como a dengaku e a sarugaku deram origem as formas tradicionais de teatro no Japão.

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História[editar | editar código-fonte]

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Noh

O nô existe com poucas alterações desde o século XIV. Ele foi criado pelo ator e dramaturgo Kan'ami (1333–1384) quando este uniu o sarugaku com música e dança.[4] Esta nova arte lhe rendeu o reconhecimento e patrocínio do xogum Ashikaga Yoshimitsu (1358-1408). Quando Kan'ami morreu, seu filho Zeami (1363–1443) deu continuidade ao trabalho do pai escrevendo peças e delineando com mais clareza as características do nô em uma série de ensaios.

Com o fim do xogunato Muromachi, o nô passou a ser patrocinado por Toyotomi Hideyoshi (1536[7?]-1598) e depois pelo xogunato Tokugawa.[4] Durante o Período Meiji, o nô sobreviveu com a ajuda da nobreza e o trabalho de autores como Umewaka Minoru (1828–1909), Hosho Kuro Tomoharu (1837-1917) e Sakurama Banma (1835-1917), os três mestres da Era Meiji. Após a Segunda Guerra Mundial o nô teve que depender basicamente de entusiastas para sua continuidade.[4]

Características[editar | editar código-fonte]

Palco do Teatro Nacional de Nô, Tóquio.

O palco do nô, todo confeccionado em cipreste japonês, é composto basicamente de uma parte principal (butai) e de uma plataforma ou passarela (hashigakari). Esta passarela serve para ligar a parte principal do palco aos bastidores através de uma cortina de três ou cinco cores (agemaku).[4] Originalmente o palco ficava ao ar livre, mas no presente é comum que fique dentro de prédios maiores, o que explica a existência do teto em estilo xintoísta. À frente do palco e da passarela estão uma escada de acesso (kizahashi) e três pinheiros.

Os músicos (hayashikata) e o coro (jiutai) ficam respectivamente na parte de trás (atoza) e à direita (wakiza ou jiutaiza) do palco. Dependendo da necessidade da peça, pode haver três ou quatro músicos que tocam uma flauta e os tambores tradicionais do Japão.

O único cenário é composto de um pinheiro e um bambu desenhados na parte de trás do palco. Todo o contexto da peça será dado pelas falas das personagens e do coro.[4] A função do coro é apresentar o pensamento e recitar as falas da personagem principal.

No nô, a personagem principal (shite) e, por vezes, algumas secundárias (tsure), utilizam máscaras. Há vários tipos de máscaras que podem ser agrupadas em três grupos: mulher jovem, homem idoso e demônio. A emoção expressa pela máscara pode mudar de acordo com a iluminação.[4]

Além das máscaras, as fantasias utilizadas pelas personagens também são uma característica importante do nô. A personagem principal, por exemplo, utiliza uma roupa com cinco camadas e também pode utilizar uma peruca vermelha ou branca. Para destacar a expressividade dos movimentos com as mãos, as personagens podem se valer ainda de um leque (chukei), usado para representar objetos ou auxiliar ações. Tudo isso gera um contraste entre o cenário simples e os movimentos contidos da personagem e os adereços chamativos utilizados.

Kyogen[editar | editar código-fonte]

História[editar | editar código-fonte]

O kyogen tem as mesmas origens do nô,[5] o sarugaku. Seria durante o século XIV que passaria a existir uma diferenciação entre o sarugaku sério, isto é, o nô e o sarugaku humorístico, o kyogen. Sendo assim, eram interpretados em conjunto e vistos como uma unidade e, por isso, o kyogen também ganharia o patrocínio da elite aristocrática durante os séculos seguintes a sua criação.

Características[editar | editar código-fonte]

Kabuki[editar | editar código-fonte]

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Kabuki

As características mais chamativas do kabuki ou cabúqui são certamente a maquiagem colorida usada pelos atores, o palco cheio de maquinário e o fato de que todas as personagens são representadas por homens. Quatrocentos anos atrás as coisas eram diferentes.

História[editar | editar código-fonte]

Okuni Kabuki-zu Byobu, tela de seis painéis, (mais antiga pintura representando Izumo no Okuni), coleção do Museu Nacional de Quioto.

Atribui-se a "criação" do kabuki a uma trabalhadora do santuário Izumo em Quioto chamada Okuni em 1603. A princípio a palavra kabuki significava algo chocante, pouco convencional e foi aplicada ao estilo de dança de Okuni e dos grupos de artistas que a imitavam (kabuki-odori).

Nessa época, o kabuki era representado em geral por mulheres (onna kabuki) e muitas delas também prostituíam-se. Por causa disso o governo proibiu as mulheres de representarem o kabuki em 1629. Essa proibição fez o kabuki representado por homens jovens (wakashu kabuki) se tornar popular. Contudo os homens jovens também se prostituíam e, por isso, em 1652 o governo proibiu os homens jovens de serem atores. Restou a permissão aos homens adultos (yaro kabuki) que ainda deveriam ser registrados e evitar apresentações sensuais.[6]

No século seguinte, o século XVIII, o kabuki desenvolveu-se muito. Foram criados novos estilos de representação como o aragoto por Ichikawa Danjuro I e o wagoto por Sakata Tojuro I; o papel dos onnagata, atores que representam papéis femininos, foi refinado; e o kabuki viu-se envolvido em uma relação de competição com o teatro de marionetes, o bunraku. Várias peças do bunraku eram adaptadas para o kabuki, levando os atores a imitarem os movimentos dos bonecos e vice-versa.[6] Também houve adaptações na estrutura do palco, introduzidas a partir do palco do nô, com a criação das passagens em meio a platéia, chamadas hanamichi, e o uso do palco giratório pela primeira vez em 1758.

Após o fim do xogunato Tokugawa em 1868, o kabuki passou por algumas tentativas de reforma com a inclusão de roupas e idéias ocidentais que não foram bem aceitas. No século XX autores como Mishima Yukio e Okamoto Kido envolvidos no movimento Novo Cabúqui (Shin kabuki) criaram novas peças ou reescreveram antigas. Ao contrário das outras formas de teatro tradicional do Japão, o kabuki continua sendo muito popular e os atores são chamados para interpretar personagens em filmes e na televisão.[6]

Características[editar | editar código-fonte]

Há várias formas de classificar o repertório do kabuki, como pelo tema ou pela sua origem. De acordo com o tema, as peças podem ser divididas em três tipos: as peças históricas (jidai-mono), as peças com temas cotidianos (sewa-mono) e as peças que destacam a dança (shosagoto).[6] Já ao se classificar as peças de acordo com sua orgiem, pode-se diferenciar entre aquelas criadas especificamente para o kabuki, as influenciadas pelo bunraku (gidayu-kyogen) e as do shin kabuki (novo cabúqui).[7]

As peças históricas tratam de incidentes envolvendo a classe dos samurais ou dos nobres. Isto tinha que ser feito de maneira disfarçada, por causa de proibições do governo Tokugawa de se apresentarem acontecimentos posteriores ao período Sengoku.[8] Podem ser subdivididas ainda de acordo com o período ao qual se referem em Ochomono, do período Heian para trás; e Odaimono dos "tempos imperiais".

As peças de temática cotidiana são mais realistas que as peças históricas e apresentam acontecimentos cotidianos da época como roubos, assassinatos e suicídios. Aqui há também uma subdivisão envolvendo as peças que tratam das pessoas das classes inferiores, as Kizewa, as quais foram muito populares no começo do século XIX.[6]

As peças que destacam a dança servem mais para demonstrar a técnica de um ator. A princípio eram tratadas como especialidade dos onnagata, os atores de papéis femininos, mas a partir do século XVIII, atores de papéis masculinos também passaram a interpretar estas peças. Atualmente há várias subdivisões de acordo com a temática da peça.

O kabuki é uma forma de teatro em que os atores buscam demonstrar suas habilidades.[6] Uma característica importante do kabuki é a maquiagem (kumadori). Ela é utilizada exclusivamente nas peças de tema histórico. As cores e os desenhos referem-se a características das personagens,[6] de forma que a cor vermelha (???) simboliza uma personagem boa, enquanto a vermelha(???), uma má.

As fantasias usadas nas peças de temática cotidiana imitam as roupas do período Edo e as usadas nas peças históricas são muito parecidas com as usadas por pessoas comuns nesse mesmo período, mesmo quando a história se passava em algum período anterior.[9]

Os acessórios usados no kabuki podem ser divididos entre aqueles que são comuns do dia-a-dia (hommono) e os objetos criados para o teatro, normalmente estilizados, exagerados.[9] As perucas são formadas por quatro partes: a parte dos dois lados do rosto (bin), a parte de trás da cabeça (tabo), a parte de cima da cabeça (mage) e a franja (maegami); que podem ser rearranjadas entre si de acordo com as características da personagem. Há uma variedade maior de perucas para personagens masculinas e as perucas usadas nas peças de temática histórica são mais estilizadas.[9]

No kabuki há uma música tocada no palco e uma música de fundo. No palco os músicos podem tocar um tipo de música longa (nagauta) ou acompanhar um cantor. Os instrumentos são o shamisen, que estava na moda quando o kabuki surgiu, e alguns possíveis tambores. Já a música de fundo usa alguns instrumentos a mais como a flauta e outros instrumentos de percussão. Os músicos de bastidores são também responsáveis por fazer a sonoplastia da peça. Um importante e característico som de fundo no kabuki é o que é feito batendo-se dois blocos de madeira, chamados hyoshigi.[6]

Bunraku[editar | editar código-fonte]

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Bunraku

História[editar | editar código-fonte]

A personagem Osono, da peça Hade Sugata Onna Maiginu.

O nome bunraku é derivado do nome do teatro de Osaka que foi o único a manter esta arte até o presente, o Bunraku-za.[10] Esta forma de teatro é também chamado de ningyo joruri em que ningyo significa boneco ou fantoche e joruri é um estilo de canto.

A origem do bunraku é desconhecida. Sabe-se que os bonecos eram utilizados religiosamente como meios de imitar as ações e palavras dos deuses e apresentações de bonecos eram feitas em templos para agradar os deuses.[11] Entre os séculos VII e XII havia titereiros, chamados kugutsumawashi, que trabalhavam com uma caixa presa ao pescoço e viajavam de cidade em cidade fazendo apresentações.[10] Durante o século XVI, alguns desses titereiros, que haviam se estabelecido nas imediações da corte, seriam chamados para fazer apresentações para os nobres. Foi nessa época que se combinaram as artes do teatro de bonecos e do canto joruri e só após esta união é que o teatro de marionetes se estabeleceria.[11]

Apesar de patrocinado pela corte de Edo, no século XVII, o bunraku se tornaria muito popular entre as classes comerciantes, em especial as de Osaka. Seria aí que, em 1684, Takemoto Gidayu abriria um teatro, o Takemotoza, no qual seriam apresentadas peças escritas por Chikamatsu Monzaemon. A princípio, estas peças tinham uma temática histórica (jidai-mono), mas Monzaemon inovaria ao produzir peças com dramas domésticos (sewa-mono) e também peças com o tema do suicídio provocado por amor que se tornariam muito populares.[10]

Ao longo do século XVIII, o bunraku se desenvolveria em relações de competição e cooperação com o kabuki.[10] As mesmas peças eram representadas em uma ou outra forma e os atores do kabuki começaram a imitar os movimentos dos bonecos. Contudo, a popularidade do bunraku começaria a declinar a partir do final do século fazendo com que as dificuldade financeiras fechassem vários teatros até que restasse apenas o Bunraku-za já no século seguinte.

Após a Segunda Guerra Mundial, o bunraku receberia financiamento do governo para se manter, mas as aulas particulares também teriam um papel importante nesse sentido.

No presente, o bunraku se recupera. Há outros grupos de bunraku fora de Osaka e o teatro Bunrakuza-za faz apresentações durante o ano inteiro, inclusive no exterior.

Características[editar | editar código-fonte]

No bunraku os bonecos são feitos de seis partes: cabeça, ombros, tronco, braços, pernas e vestimenta. Há ainda um pedaço de bambu para dar forma aos quadris. Há setenta tipos de cabeças[10] divididas em vários estereótipos. Há fios que controlam os olhos, sobrancelhas e a boca dos personagens e que se ligam a um buraco no centro da madeira nos ombros. Curiosamente, os bonecos de personagens femininas geralmente não têm pés, já que os quimonos que vestem as cobrem completamente.[10]

Inicialmente só havia um controlador para cada boneco, enquanto hoje existem três. O omozukai, mais hábil, controla a cabeça e o braço direito; o hidarizukai controla o braço esquerdo; e o ashizukai controla os pés ou, no caso de personagens femininas, a ponta do quimono para simular o movimento dos pés. O ashizukai também bate os pés para fazer o som do boneco caminhando e para dar ritmo ao shamisen.[10]

O controlador do boneco trabalhava sem visto no palco, mas desde que Tatsumatsu Hachirobei, um grande mestre, apareceu ao público na peça "Os suicídios de amor de Shinozaki" (Shinozaki shinju), os três controladores trabalham à vista. Da mesma forma, o tocador de shamisen e o narrador (tayu) não apareciam para o público, mas desde que Takemoto Gidayu cantou na frente do público ficam em uma plataforma à direita do palco. É possível haver mais de um tocador de shamisen e tayu em ocasiões específicas, como a interpretação de uma peça do kabuki.[10]

Takarazuka Kagekidan[editar | editar código-fonte]

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Takarazuka Revue

O Takarazuka é um tipo de musical japonês onde somente mulheres podem atuar. Elas são divididas em "otoko-yaku", ou papel masculino e "onna-yaku", papel feminino pela sua altura.

História[editar | editar código-fonte]

Características[editar | editar código-fonte]

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. MIKEVIS, DAYANNE. Teatro japonês nasceu da mitologia xintoísta. 15 de janeiro de 2008. Visitado em 6 de maio de 2008
  2. VANZELLI, José Carvalho; RODRIGUES, Camila. Teatro tradicional Japonês. Visitado em 6 de maio de 2008.
  3. DAVIS, F. Hadland. Mitos e lendas do Japão. São Paulo: Landy Editora, 2004. pp. 19-21. ISBN 85-7629-023-5
  4. 4,0 4,1 4,2 4,3 4,4 4,5 Web Japan. Noh and Kyogen: The world’s oldest living theater. Acessado em 1 de setembro de 2008.
  5. BRAZELL, Karen. Traditional Japanese Theater: an anthology of plays. New York: Columbia Press, 1998. p. 10. ISBN 0-231-10872-9
  6. 6,0 6,1 6,2 6,3 6,4 6,5 6,6 6,7 Web Japan. Kabuki: A vibrant and exciting traditional theater. Acessado em 6 de Agosto de 2008.
  7. Invitation to Kabuki: Guide for Kabuki appreciation. History of Kabuki: Popularization of Gidayu-kyogen. Acessado em 31 de agosto de 2008.
  8. Invitation to Kabuki: Guide for Kabuki appreciation. Kabuki repertoire:Classfication of repertoire. Acessado em 31 de Agosto de 2008.
  9. 9,0 9,1 9,2 Invitation to Kabuki: Guide for Kabuki appreciation. Expression in Kabuki: Expression of roles. Acessado em 31 de agosto de 2008.
  10. 10,0 10,1 10,2 10,3 10,4 10,5 10,6 10,7 Web Japan. Bunraku: Puppet theater brings old Japan to life. Acessado em 22 de Julho de 2008.
  11. 11,0 11,1 BRAZELL, Karen. Traditional japanese theater: an anthology of plays. New York: Columbia University Press, 1998. p. 11. ISBN 0-231-10872-9


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