Civilizações da Antiguidade/Cartago

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Cartago



Cercada de lendas, esta cidade nasceu no norte da África. Seu fim foi triste a ponto de fazer chorar um general romano.

Cartago foi uma potência do mundo antigo, disputando com Roma o controle do Mar Mediterrâneo. Dessa disputa originaram-se as três Guerras Púnicas, após às quais Cartago foi destruída.


porto circular de Cartago

A lenda[editar | editar código-fonte]

Das cidades fenícias, Tiro era a mais importante, chamada a pérola do oriente. Grandes comerciantes, exímios navegantes, os fenícios compravam, vendiam e dominavam os mares, povo pacífico, sua riqueza se baseava no comércio.

construção de Cartago - Joseph Mallord William Turner

A história ou lenda da fundação de Cartago começa por volta de 814 a.C. nos versos do poeta Virgílio.

O rei de Tiro, Mutto, tinha dois filhos, Pigmalião e Elisa. Com sua morte eles herdam o reino.

Pigmalião desejando governar sozinho, mata o marido de Elisa. Esta de nada sabe e continua pensando que o marido estava vivo. Até que um dia, Sicharbas (o marido) aparece no sonho de Elisa e lhe conta toda a verdade, pedindo para que ela fuja de Tiro.

Para a fuga, ela desenterra o tesouro que o falecido marido lhe indicara onde estava. Na surdina, Elisa prepara navios, escravos e convence os nobres descontentes a se juntarem a ela. Assim ela foge rumo ao ocidente.

Seus navios fazem escala em Chipre onde embarca o sacerdote de Zeus e 80 virgens que Elisa leva, para se casarem com os nobres tírios embarcados.

Desse ponto em diante, Elisa passa a ser chamada Dido, A Errante.

A lenda prossegue com a chegada à costa africana e as negociações com os nativos para ocupar terras. Os nativos eram líbios da tribo dos maxios. Conta a lenda que Dido só poderia ocupar o tanto de terras que fosse coberto por uma pele de boi.

Vamos atentar ao fato de que Dido, era fenícia (não poderia negar a fama de bons negociantes de seu povo), então ela cortou a pele em tiras bem finas e com elas rodeou uma colina que foi chamada Byrsa (pele de boi, em grego).

Assim foi fundada a cidade chamada Kart-Hadasht (Nova Cidade), em fenício.

Localização geográfica[editar | editar código-fonte]

localização de Cartago no Mediterrâneo

Cartago (do fenício Kart-Hadasht, ou Qrthdst, isto é « Nova Cidade », em árabe قرطاج (Qartaj) ) é uma antiga cidade, originariamente uma colônia fenícia no norte da África, situada a leste do Lago de Túnis, perto do centro de Túnis, na Tunísia.

Neste local o mar Mediterrâneo se estreita, entre a costa africana e a Sicília.

Local de clima agradável, o deserto impedia qualquer ataque vindo do interior. Por mar, nem pensar, porque seria enfrentar os maiores navegantes da época.

Os fenícios escolhiam os locais para fundar seus entrepostos baseados na estratégia comercial. O local deveria ser de fácil acesso por mar, ter portos protegidos em baías amplas e ter facilidade de acesso a matérias-primas e pontos de venda.

Como começou[editar | editar código-fonte]

Cartago foi fundada pelos tírios, mesmo observando a lenda, Dido era tíria. Tiro era uma cidade da Fenícia e o povo fenício era um caso à parte, na época.

Os fenícios eram um povo de origem semita que provavelmente vinham do Golfo Pérsico ou da Caldéia. Acredita-se que tenham chegado às terras que hoje formam o Líbano por volta de 4000 a.C.

As cidades-estado fenícias funcionavam como uma federação e capitaneadas pela cidade de Tiro, fundaram entrepostos comerciais em parte da Sicília, sul da península Itálica, no litoral da península Ibérica e no norte da África, onde surgiu o entreposto que se tornou a famosa Cartago.

A cidade de Cartago foi fundada em 814 a.C. e em 500 a.C., a cidade já era poderosa. Os fenícios dominavam a metalurgia, fabricavam ligas de ouro e outros metais, faziam armas e objetos de cerâmica. Mas, seu grande poder vinha de sua frota naval.

cabeça em vidro, amuleto

Nessa época, Roma estava nascendo, era uma pequena cidade da Itália enquanto Cartago era a dona do Mediterrâneo.

Um povo nada belicoso, que se desenvolveu através do comércio e não de guerras, hábeis navegantes que usavam sua capacidade naval apenas para negociar. Fundaram entrepostos comerciais em diversos pontos do Mediterrâneo, mas nunca ocuparam mais terras do que o necessário e nunca atacaram outros povos gratuitamente.

Nenhum dos muitos entrepostos fenícios foi como Cartago.

A cidade de Cartago era envolvida por uma muralha e possuía prédios de vários andares. Através dos vestígios encontrados, se sabe que, a cidade alta ficava na colina de Byrsa, a cidade baixa rodeava o porto.

Os estudos atuais praticamente comprovam a existência dos famosos portos de Cartago. Havia um porto para os navios mercantes e outro para os navios de guerra.

Poder e riqueza[editar | editar código-fonte]

Cartago, por estar afastada fisicamente da Fenícia prosperou, enquanto no oriente, as cidades-estado fenícias foram atacadas pelos assírios e depois pelos babilônios.

portos púnicos em 1958

No perímetro do mar Mediterrâneo, era Cartago quem dava proteção aos entrepostos fenícios.

Politicamente, Cartago era uma talassocracia assim como a Fenícia, um Estado governado por homens ligados ao mar.

terracota púnica, Ibiza, Espanha

Havia uma constituição, o chefe de Estado era um juiz chamado Sufete, mas quem de fato tomava as decisões, era o Senado e seus 300 membros.

Os cartagineses não possuíam exército e nem confiavam nos militares. Se fosse preciso, contratavam mercenários, que eram liderados por generais cartagineses.

O povo era pacífico e se fosse possível evitava guerras.

Os cidadãos de Cartago eram alfabetizados e davam especial valor ao desenvolvimento profissional. Vamos dizer que Cartago se tornou uma república aristocrática, era uma região muito rica e cobiçada.

O cronista Diodoro de Sicília conta, que lá havia pomares e jardins, rios canalizados, casas de campo luxuosas. As terras eram cultivadas com vinhedos e oliveiras, além de outras árvores frutíferas. Havia gado, rebanhos de ovelhas e cavalos.

Os tempos de paz permitiram que Cartago usufruísse do que havia de melhor.

Religião[editar | editar código-fonte]

O povo de Cartago conservou as crenças religiosas dos fenícios. Tanit era a Senhora de Cartago, Baal Hamon, Eschmun, Melqart e Astarte eram alguns dos deuses principais.

Tofet em Salambo

Os estudiosos ainda não estão certos quanto ao uso do Tofet. Essa é uma palavra hebraica e significa, santuário a céu aberto.

É possível que ali fossem praticados sacrifícios humanos ao deus Baal. Foram encontrados no Tofet jarras contendo ossos carbonizados de crianças. Talvez o Tofet fosse um cemitério, não há nada ainda, que aponte o uso exato do local.

Os cartagineses davam mais importância à monogamia e eram mais severos com os assuntos religiosos do que os fenícios orientais.


O controle do Mediterrâneo[editar | editar código-fonte]

deusa Tanit

A partir de 800 a.C., a Fenícia fez parte, sucessivamente, do Império Babilônico, do Império Persa e do Império Macedônico.

Com a queda de Tiro, em 332 a.C. a hegemonia passou para Cartago, que se tornou a grande potência do Mediterrâneo ocidental, dominando os entrepostos da Sicília, Sardenha, Córsega e Espanha.

Os gregos, nessa altura, estavam aprendendo tudo o que podiam sobre navegação e construção de barcos com os seus até então parceiros, fenícios.

Por causa de seu interesse sobre a Sardenha e a Sicília, os gregos resolveram testar os fenícios.

No oriente, a Fenícia não dava conta dos ataques de Nabucodonosor II e quem saiu em defesa dos interesses fenícios foi Cartago, assim se afirmando como a potência maior.

Gregos e cartagineses se enfrentaram inúmeras vezes durante várias gerações pelo monopólio do Mediterrâneo, que acabou nas mãos dos romanos.

Guerras Púnicas[editar | editar código-fonte]

Púnico – latim = poeni

Esse era o nome pelo qual os romanos chamavam os cartagineses.

Por volta de 300 a.C. Roma já começava a se tornar um Estado militarizado, mas não possuía uma frota, muito menos navios da qualidade dos cartagineses.

restos do barco fenício Mazarron II

O fato de Cartago superar os gregos, e sua marinha poderosa manter o controle sobre as ilhas cobiçadas pelos romanos, como a Sardenha, fazia com que Roma os invejasse.

Era preciso saber como eram feitos aqueles navios.

A primeira guerra púnica começou com os romanos, que desrespeitaram um acordo de não invadir a Sicília. Os romanos perderam 700 navios e os cartagineses 400. Mas, a sorte estava com os romanos que capturaram um navio cartaginês.

Desmontado, o navio foi copiado e assim os romanos construíram uma frota e introduziram novidades, como o corvo, que era uma espécie de ponte móvel que usavam para abordar os barcos inimigos. Dessa forma partiam para a luta corpo a corpo que era onde se destacavam.

As guerra púnicas são conhecidas e muito estudadas, de modo que, é preciso apenas frisarmos que os cartagineses não eram afeitos a guerras e nem mesmo aos militares, e com isso levaram grande desvantagem.

É preciso mencionar também a coragem, a bravura de Amílcar e seu filho Aníbal cujo nome significa amado de Baal.


Amílcar abafou a revolta dos mercenários que voltaram da primeira guerra derrotados. Conseguiu ocupar um terço da península ibérica, assim se fortificou e acumulou riquezas para enfrentar a segunda guerra.

Aníbal, filho de Amílcar, aos nove anos jurou jamais ter relações amistosas com os romanos. Foi ele quem assumiu o comando dos cartagineses na península ibérica.

Ao tomar a cidade de Sagunto foi ameaçado pelos romanos, mas não voltou atrás e foi assim que acendeu o estopim da segunda guerra púnica.

Homem de coragem, inteligência e um grande general foi durante muitos anos uma terrível ameaça para os romanos. Ele só foi derrotado porque seus mercenários mudaram de lado.

Aníbal voltou a Cartago derrotado, mas a despeito da antipatia dos cartagineses para com os militares, ele foi recebido como herói. O povo reconheceu sua coragem e bravura.

Entre a segunda e a terceira guerra púnica, os romanos conquistaram a Macedônia, Grécia, Ásia Menor e Síria.


O fim[editar | editar código-fonte]

senador romano Catão

Em 149 a.C. Cartago já não era mais ameaça para os romanos mas ainda detinha o território de Túnis (Tunísia).

O senador romano, Catão, decidiu tomar Túnis e para isso mandou o exército destruir Cartago. A ordem:

Delenda est Carthago ou Cartago deve ser destruída.

O general encarregado dessa ingrata tarefa foi Capião Emiliano. Apesar dos seis dias de resistência, os romanos derrubaram as muralhas, a população foi assassinada, as casas demolidas, os que sobreviveram foram transformados em escravos e, dizem, sobre o solo espalharam sal para que nada mais germinasse.

O general romano Cipião Emiliano teria chorado após a vitória, quem sabe imaginando que Roma também pudesse vir a passar por tamanha violência ou talvez, com pena de arrasar uma civilização notável.

Ainda os romanos[editar | editar código-fonte]

vista do litoral, ruínas de Byrsa

Toda a destruição mencionada acima ainda não tinha terminado.

Durante pelo menos cem anos, Cartago permaneceu ocupada pelos romanos, explica a arqueóloga Karin Mansel do Instituto Arqueológico Alemão.

No ano 29 a.C. Otávio Augusto (que viria a ser imperador) fundou sobre a colina de Byrsa a colônia Iulia Concordia Carthago.

Num trabalho que deve ter levado vinte anos, foi feita a nivelação do terreno e assim foi destruído todo e qualquer vestígio da Cartago fenícia.

Uma parte das edificações romanas ainda permanece como lembrança da destruição do coração de um grande império, de um povo notável com suas muralhas, templos e palácios, sua história lançada em escombros colina abaixo.